O Pai revelado pelo Filho

Monsenhor Jonas Abib

Estou muito contente neste dia em que festejamos o Santuário do Pai das Misericórdias.

É com muita emoção que eu venho fazer esta pregação, porque, depois que saí daquela situação de saúde em que eu estava graças a Deus, tenho pregado nas homilias das Santas Missas e em outras ocasiões, mas vir ao palco para fazer uma palestra é a primeira vez. Então, eu agradeço muito a Deus e também às muitíssimas orações que foram feitas por mim. E esperem porque neste ano não vai ser a primeira que farei isso, pois Deus há de me dar forças para isso, como me deu para sair da situação em que eu estava.

Como eu dizia, nós estamos celebrando a festa do Santuário do Pai das Misericórdias. Dom Beni, que ontem celebrou a Santa Missa das 18 horas, quando nós estávamos na reta final para a dedicação do Santuário do Pai das Misericórdias, me disse que todo santuário tem de ter uma festa, de maneira que todos os anos naquele dia se festeje essa data. E ele mesmo deu a sugestão: “Por que não realizarmos a festa no dia da Santíssima Trindade?”. E esta é a primeira vez em que celebramos a festa do Santuário do Pai das Misericórdias. Feliz de você que pode celebrar junto conosco esse lindo acontecimento!

Eu quero começar a pregação com o texto que Deus me inspirou quando pensamos no santuário do Pai das Misericórdias. A primeira ideia foi ser um Santuário do Pai, parecia estranho, mas a inspiração era essa e, então, eu fui pesquisar na Bíblia um texto que falasse de Deus Pai. Pegue na sua Bíblia 2 Coríntios 1: “Bendito seja Deus, o Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das Misericórdias e Deus de toda a consolação”. E aí veio a inspiração do nome “Pai das Misericórdias”. A primeira coisa é que Ele é o Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo e, depois, Ele é o Pai das Misericórdias que nos conforta em todas as nossas tribulações, para que, consolados por Ele, possamos consolar aos que estão atribulados. Esse é o texto-mestre do santuário.

Ele é o Pai das Misericórdias e Deus de toda a consolação. Veja, muita gente estranha esta expressão: “Pai das Misericórdias”. E por que Pai das Misericórdias? É que o povo semita não tinha aumentativos em seu vocabulário, então, muitas vezes, eles faziam o aumentativo no plural. O que São Paulo queria dizer era que o Pai era um Pai “daquela” Misericórdia, imensa, mais do que imensa: infinita. E para completar isso ele escreveu “das misericórdias”, mas no sentido aumentativo ao escrever: das misericórdias infinitas. E Deus de todas as consolações, por que Ele é o Pai de todos os momentos e de todas circunstâncias em que eu e você precisamos de misericórdia.

Por isso diga comigo: “Obrigado, Pai, porque o Senhor é o Pai das Misericórdias e também o Deus de todas as consolações. O Senhor é presente na minha vida e nunca me abandona. E eu agradeço muito, Pai de toda a consolação, por me confortar em todas as tribulações.”

Quem tem tribulação aqui? Todo o mundo? Eu também. Agora há pouco eu citei uma grande tribulação pela qual passei, ela demorou 5 anos, mas apesar de tudo, apesar das coisas que não mudavam, o Pai estava comigo. Eu tinha um Pai, pleno de amor, que é todo amor, comigo. Ele estava comigo e, porque Ele estava comigo, eu podia estar tranquilo, sofrido, mas tranquilo.

Nas nossas tribulações, porque temos a certeza de que o Pai está conosco, embora nós estejamos sofridos, estamos tranquilos e não nos desesperamos nem vivemos ansiosos; ao contrário, nós nos jogamos nos braços desse Pai e, justamente, ao nos jogarmos nos braços desse Pai, isso traz a nós toda a consolação. E agora vem uma coisa muito bonita: Deus não é egoísta e porque Ele não o é, não quer que nenhum de nós sejamos egoístas. Mas ao contrário, Ele quer que, mesmo nas tribulações, confortemos uns aos outros. E enquanto somos consolados por Ele precisamos consolar os outros.

Eu espero em Deus que você não esteja sentindo angústia. A angústia é uma coisa terrível, Jesus a experimentou no Horto das Oliveiras. Há uma semana eu fui para o Pentecostes na Terra Santa, e lá eu tive a alegria de celebrar uma das Missas no Horto das Oliveiras. Justamente naquela gruta em que ficaram os apóstolos, quando Jesus foi mais acima, pois Sua angústia era muito grande e Ele precisava estar só. E na Sua angústia Ele suou Sangue! Os médicos explicam que isso só acontece quando a angústia é muito aguda. E Jesus suou Sangue em vez de suor. Ele experimentou a angústia para ser consolo a todos aqueles que passam pela dor da angústia. Espero que você não passe por isso [angústia].

Eu não passei ainda por isso desse modo, mas passei pela tribulação. Mas tenha certeza de que, se você sentir angústia, o Pai estará ao seu lado, assim como estava com Jesus. Nas minhas angústias o Pai estava comigo, como estava com Nosso Senhor Jesus Cristo, por isso eu estava tranquilo. Parece uma coisa estranha, não é mesmo? Estar tranquilo passando por uma angústia e por uma tribulação. Mas só acontecerá isso porque o Pai estará com você.

Veja que riqueza! Eu poderia pregar muito mais ainda sobre esse texto. Mas veja que riqueza que Deus me inspirou para ser o fundamento para o Santuário do Pai das Misericórdias.

Eu posso dizer que eu sou objeto da Misericórdia do Pai. O Pai teve uma imensa Misericórdia por mim durante toda a minha vida.

Monsenhor Jonas Abib, funfdador da Canção Nova/ Foto: Wesley Almeida

Monsenhor Jonas Abib, fundador da Comunidade Canção Nova/ Foto: Wesley Almeida

:: Veja mais foto no flckr

O meu nascimento foi dificílimo. Era um parto natural, feito em casa. O que aconteceu é que, com todo o esforço de minha mãe e de todas as parteiras, eu não nascia, minha mãe estava esgotada. Aí foram atrás de um médico, pois não existia médico na minha cidade. Este fez de tudo, até usou fórceps, mas mesmo assim eu não conseguia nascer. O médico percebeu que o caso era encerrado. E pediu que minha mãe descansasse e depois contou ao meu avô que a criança não tinha condições para nascer. E como Deus era misericordioso comigo, ao lado do quarto onde estava minha mãe, havia uma sala e nela estava um rapaz do sobrenome Bosco. Esse rapaz disse que havia um santo com o nome dele, mas o pessoal começou a gozar dele, e ele começou a dar mais detalhes do santo que era da Itália, do Piemonte. E explicou os trabalhos dele com os meninos e que ela havia sido canonizado em 1934 (e isso era 1936).

Minha mãe, ao escutar tudo isso no quarto ao lado, disse: “Dom Bosco, eu não conheço o senhor, mas eu consagro esse menino à sua intercessão, cuide dele para mim”. Foi uma coisa inimaginável, imediatamente a minha mãe chamou as parteiras. O menino [referindo-se a si mesmo], que até então não nascia de jeito nenhum, veio com uma grande facilidade. Somente com um esforcinho da minha mãe o menino nasceu.

Passou o tempo e minha mãe não ficou pensando nisso. Um tempo depois, quando tivemos que voltar para São Paulo, minha mãe começou a levar o meu irmão a uma clínica. Para chegar à clínica ela passava por uma igreja, onde ela via uma imagem de um santo, que a atraía. Um dia, naquela hora em que ela estava na igreja, o sacristão passou e ela lhe perguntou de que santo era aquela imagem. Ele, que era um irmão salesiano, disse que era Dom Bosco e lhe contou a história do santo. Minha mãe se lembrou na hora de que era aquele santo do qual o Bosco falou no dia do meu nascimento. E daquele dia em diante, ela fazia questão de parar diante daquela imagem e me consagrar novamente a Dom Bosco.

Depois de um tempo, fui estudar em uma escola salesiana, e foi lá que fui ser coroinha, que eu fazia adorações a Jesus Eucarístico na madrugada. Chegava à noite e saía às 6 da manhã. Era Dom Bosco me encaminhando. Depois dessas adorações sempre havia um padre para nos confessar. Esse padre era a própria figura de Dom Bosco, que atendia pacientemente a confissão dos meninos. Depois da madrugada inteira aos pés do Senhor, às 6 da manhã, eu saía alegre como um passarinho. Era o Pai das Misericórdias cuidando de mim. E a seguir eu fui para o seminário e veio toda a minha vida, o trabalho que depois comecei a fazer com os jovens e, então, anos mais tarde, veio a Canção Nova. Eu não tenho a mínima dúvida de que tudo isso aconteceu por causa da consagração que minha mãe fez a Dom Bosco.

Eu agora faço um grande salto na história. Eu ja era padre, trabalhava com os jovens, um trabalho intenso. Eu criei os encontros de jovens, que atingiram muitos jovens, rapazes e moças, criou-se mesmo um movimento que se chamou “Construindo”. Eu trabalhava muito no colégio, na paróquia e nos encontros de jovens, que eram feitos em Campos do Jordão (SP), uma cidade muito fria. E, muitas vezes, para atender as confissões dos jovens eu ia até a madrugada, e em razão de todos esses trabalhos, fiquei tuberculoso.

Foi um golpe muito grande, mas, quando eu descobri que estava tuberculoso, eu me entreguei a Deus. E depois fui me tratar em Campos do Jordão mesmo, num sanatório. Terminado o tempo do sanatório, eu pensava que iria voltar a fazer o trabalho com os jovens. Mas aí aconteceu uma coisa que causou muita dor no meu coração: o meu superior me disse que eu viria para Lorena (SP). Eu vim como se fosse para o exílio. Aí tinha se cortado todo o meu trabalho com os jovens e, com o passar do tempo, fui percebendo que o meu retorno para São Paulo tinha ficado para trás. E fui me enchendo de mágoa, ressentimento e de revolta.

Eu nunca tinha sido assim, mas fiquei devido à minha fraqueza. Eu era o próprio ressentimento, a própria mágoa em pessoa. E com isso eu já não rezava mais. Imagine um padre que não reza. Eu só rezava o Ofício Divino porque era obrigado. Não tinha gosto para a oração e não rezava. O pior é que, no final das contas, eu não sentia falta disso. É uma pena, mas eu não sentia falta de rezar. Mas um coisa eu fiz: o propósito de todas as noites, antes de me deitar, rezar: “Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis […]”.

Havia um grupo de jovens no colégio onde eu estava e comecei a trabalhar com esse grupo. Mas eu percebi que faltava vida naquele grupo. Eles vinham das reuniões e das Santas Missas, mas não havia dinamismo. Foi então que eu pedi, na época, ao padre Irineu Danelon, hoje Bispo Dom Irineu, para que ele fizesse uma palestra sobre ação. Só que o padre Irineu pegou uma Bíblia e, a partir dos Atos dos Apóstolos, começou a mostrar a presença e a ação do Espírito Santo. Mostrou o Espírito Santo agindo em Jesus; a ação do Espírito Santo nos apóstolos; mostrou Pentecostes e o que aconteceu depois de Pentecostes, e foi em frente, tudo só na Bíblia. E eu, no fundo da sala, escutando e gostando, me maravilhando, pois eu conhecia tudo aquilo, mas não daquele jeito. E fui percebendo que era aquilo de que eu precisava. Eu era um padre que não rezava e percebi que era aquilo que eu precisava. Eu não aguentei, saí da sala, desci as escadas, fui à capela e disse diante do Senhor: “Senhor, eu não estou entendendo nada, eu sinto que é disso que eu preciso, então, Senhor, me dá essa graça”. Mas isso com toda a força, com toda a fé, com todo o dinamismo, eu pedi: “Dá-me isso, Senhor.”

Terminou a palestra, daí houve um intervalo e depois do intervalo fomos para a Missa. Terminada a Missa, tocou o telefone, era o padre Lauro, um redentorista, me dizendo que havia dois padres que queriam fazer o encontro que o padre Haroldo Hahn iria fazer e me pediu duas vagas. Eu nem sabia qual era o encontro, mas disse que iria arrumar sim.

Depois dessa ligação me veio uma inspiração: “Eu vou fazer esse encontro!”. Padre Haroldo Hahn, um sacerdote jesuíta que estava levando uma experiência, em todo o Brasil, do que ele chamava de “Experiência de Oração”. O encontro seria no dia 2 de novembro, porque era feriado e não teria aula, então ele iria aplicar essa experiência nos nossos seminaristas. E dentro de mim eu dizia: “Eu preciso fazer esse encontro!”.

Mas, chegou na véspera, portanto, dia 1º de novembro, e o meu superior me disse que, de manhã, eu iria celebrar em Silveiras (SP), uma cidade aqui próxima, e à tarde haveria reunião de professores. Quando chegou à noite, eu cheguei ao meu quarto e estava indo rezar o “Vinde, Espírito Santo”, parei e me entreguei nas mãos de Deus: “Senhor, eu abro mão de minha vontade. Eu queria muito fazer esse encontro, eu precisava fazer esse encontro, mas eu o entrego em Suas mãos”. E rezei a oração, clamando: Vinde, Espírito Santo.

No dia seguinte, logo foram me dizendo que o padre Haroldo queria falar comigo, pois já nos conhecíamos. Foi bom, nós conversamos, mas eu já sabia o meu destino: de manhã celebrar as Missas e à tarde a reunião. Mas quando o pessoal foi entrando para a sala do encontro, meu superior me disse: “Vai fazer esse encontro.” Era o empurrão do Pai das Misericórdias para que eu fizesse esse encontro.

Foi um dia só. Padre Haroldo disse o que estava acontecendo no mundo com a Renovação Carismática Católica (RCC); isso era no ano de 1971. Aquilo foi me tocando muito e eu fui me interessando cada vez mais por esse movimento eclesias. Ele falou a respeito do batismo no Espírito Santo, falou dos dons do Espírito Santo. O que ele pôde falar em apenas um dia ele falou. Disse ainda o que Deus estava fazendo no mundo por intermédio do Espírito Santo de Deus. Tivemos a celebração da Santa Missa e, no final dela, padre Haroldo virou para nós, padres, na sacristia e disse: “Se vocês quiserem, eu imponho as mãos sobre vocês para que recebam o batismo desse Espírito Santo de que eu lhes falei.” E nós aceitamos e ele foi passando um por um e pedindo o Espírito Santo. Quando ele chegou em mim, eu pedi essa graça do fundo do meu coração. Eu entendi o que o padre Irineu tinha falado e o que o padre Haroldo tinha falado naquele dia. Era daquilo de que eu precisava. Eu queria o Espírito Santo. Padre Haroldo impôs as mãos e eu não senti nada, absolutamente nada naquele momento. Foi uma espécie de decepção. Eu desejei tanto aquilo e nada aconteceu. Mas naquela noite, sozinho, nos pátios do colégio, andando por lá e para cá, eu comecei a rezar.

Veja: um padre que não rezava, começou a rezar, como nunca eu tinha rezado na minha vida! E não era a oração em línguas não, era uma oração normal que me tomava inteirinho, eu tinha gosto com aquela oração e passei a madrugada toda orando. Daí fui para o quarto, dormi um pouco e na manhã seguinte estava tudo diferente. As árvores, as flores e as pessoas estavam mais bonitas, tudo estava bonito, esplendoroso. Eu não podia imaginar que não eram as coisas que estavam bonitas, mas era meu interior. O meu interior tinha mudado. Naquela imposição das mãos, na qual eu não senti nada, eu recebi o Espírito Santo. Era o dia 2/11/1971. Repare bem que a RCC chegou ao Brasil em 1970.

Eu fiz parte das primeiras turmas a ser batizadas no Espírito. Tudo mudou na minha vida. A minha oração mudou, ela tinha força, alegria, vida, eu rezava com gosto. A Celebração da Eucaristia eu comecei a celebrar de forma diferente. A minha pregação mudou. Até mesmo o arrependimento dos meus pecados mudou. Os pequenos pecados me causavam grande arrependimento.

Daí então percebi que eu não era o que tinha que ser ainda. Eu não era ainda o que Deus queria que eu fosse, mas eu já não era o mesmo, eu já era uma outra pessoa pela ação do Espírito Santo.

Depois de um mês eu tive a oportunidade de ficar um fim de semana para fazer a Experiência de Oração toda e escutar todas as palestras. E ali fui entendendo o que tinha acontecido comigo durante todo aquele mês. O encontro foi uma confirmação. Eu não era mais o mesmo. O Pai, ao me dar o Seu Espírito Santo, me fazia um homem novo, um padre novo.

Gente, eu só posso dizer que tudo isso que você vê hoje na Canção Nova, que você contempla pelos meios de comunicação, tudo veio a partir daquele momento da imposição das mãos do padre Haroldo sobre minha cabeça e do batismo no Espírito Santo. Você está sentado nesse acontecimento, sobre o fruto de meu batismo no Espírito Santo.

↑ topo