As Novas Comunidades na solicitude dos bispos

1. INTRODUÇÃO

Passagem bíblica: 1ª Cor 6, 1-13

Durante esta 12ª Conferência da Fraternidade das Comunidades, por diversas vezes a palavra de Bento XVI veio à tona, ajudando-nos a entender o que estamos vivendo juntos. De verdade, testamos buscando o que somos, já que o Espírito Santo nos revela, pouco a pouco, o lugar que cabe na Igreja às Novas Comunidades, dentro do grande contexto dos Movimentos Novos, cujo surgimento oferece novas luzes para a Evangelização e novas possibilidades de entrega ao Reino de Deus e à Igreja. De novo, é o Santo Padre, quando Cardeal, que nos oferece o ponto de partida para refletir sobre as Novas Comunidades na Solicitude Apostólica dos Bispos.

“No contexto secularizado em que nos encontramos, explicava em 1999 a um grupo de Bispos, reunidos em Roma para um Seminário organizado pelo Pontifício Conselho para os Leigos, os Movimentos têm esta especificidade de “ajudar a reconhecer numa grande Igreja, que poderia aparecer somente como uma grande organização internacional, a Casa na qual se encontra a atmosfera própria da família de Deus, permanecendo ao mesmo tempo, dentro grande família universal dos santos de todos os tempos”.

Diante de um fenômeno tão inesperado como o atual florescimento dos Movimentos, em 1998, observou o Cardeal Ratzinger, ainda em 1998, as dificuldades que surgiram: “Não faltaram pessoas que se sentiram incomodadas em seus debates intelectuais e em seus modelos de Igreja totalmente diferentes, construídos nos escritórios, segundo a sua própria imagem.

E como poderia ser diferente? Onde irrompe, o Espírito Santo sempre modifica os projetos humanos! Mas existiram e existem também dificuldades sérias. Os Movimentos, de fato, mostravam sinais de uma condição ainda infantil. Colheram a força do Espírito, mas este Espírito age por meio dos homens e não os livra por encanto de suas fraquezas. Houve tendências ao exclusivismo, a acentuações unilaterais, com as conseqüentes dificuldades para a inserção nas Igrejas locais. De seu zelo juvenil, muitos tiravam conclusão de que a Igreja devesse elevar-se ao seu modelo e ao seu nível e não vice-versa. Aconteceram choques dos quais, de vários modos, foram responsáveis ambas as partes. Fez-se necessário refletir como as duas realidades pudessem estabelecer um relacionamento justo. “Por outro lado, está em jogo um fenômeno que se apresenta de novo periodicamente na história da Igreja.

Existe a forma permanente e basilar da vida eclesial, na qual se exprime a continuidade de sua história. E existem as irrupções sempre novas do Espírito Santo, que tornam sempre viva e nova a estrutura da Igreja. Mas sempre foi difícil que esta renovação ocorresse sem sofrimentos e choques”.

Nasce então a exigência de uma séria reflexão teológica que saiba indicar aos Movimentos e às Comunidades o seu lugar específico na Igreja. Ainda o Cardeal Ratzinger constatou que “parece evidente que, de uma parte, o modelo eclesial local, decididamente entendido a partir do ministério episcopal, é a estrutura que sustenta a vida da Igreja e é permanente, através dos séculos. Mas este mesmo modelo é perpassado incessantemente pela onda de Movimentos, que revalorizam continuamente a dimensão universal da missão apostólica e a radicalidade do Evangelho e, justamente por isso, ajudam a assegurar vitalidade e verdade espirituais para as Igrejas locais”.

A sinfonia da vida eclesial há de se realizar na reciprocidade do dom entre as duas dimensões, aquela “petrina”, institucional, expressa no ministério do Papa e dos Bispos em comunhão com ele, e a “mariana”, carismática. Na era apostólica, as duas dimensões têm importância fundamental  !

Ouça: Missão das Novas comunidades: "Abrir horizontes e campos de evangelização"

2. AS NOVAS COMUNIDADES NAS IGREJAS LOCAIS

Trata-se então de empreender um sério trabalho, para que venha à tona a sinfonia, composta como uma peça musical na qual se entoe ao Pai um hino, que é o próprio Cristo.

Da parte dos Bispos e das respectivas Igrejas Locais, nasce uma grande responsabilidade. De fato, fez parte do Ministério Episcopal a graça (“Carisma”) do discernimento. Não somos proprietários da ação do Espírito Santo, mas cabe a nós, Bispos, identificar, mediante a docilidade cultivada na oração, onde se encontram os caminhos para a Evangelização.

As Novas Comunidades são acolhidas porque fazem parte da novidade com que Deus que agraciar a Igreja em nosso tempo. Elas nasceram do próprio Espírito Santo, que quer que sejam espaços e instrumentos de vida comunitária, santidade e missão.

Ao lado de outras formas de dedicação a Deus, as Comunidades são reconhecidas como presente de Deus. Posso dizer, em nome de tantos irmãos bispos e fortalecido com a presença daqueles que vieram ao Encontro que precedeu a realização da Conferência, que as Novas Comunidades têm um lugar nas nossas Igrejas e no coração dos Bispos. E, como ouvimos ontem, também no coração do Papa.

Ouça: "Somos chamados a ser uma expressão do que a Igreja precisa ser"

3. O QUE OS BISPOS ESPERAM DAS NOVAS COMUNIDADES

No último mês de Março, realizou-se em Bogotá o primeiro Congresso Latino-americano de Movimentos Eclesiais e Novas Comunidades. Naquela ocasião, coube-me exatamente o tema das expectativas dos pastores a respeito de vocês. Não são diferentes os pontos que quero apresentar-lhes hoje. Antes, devo ampliá-los, já que a presente Conferência trata de Comunidades com relacionamento estável.

A) “Evangelizar”!  Acolham o desafio da Evangelização. Saiam de si mesmas e olhem para o mundo. Digam com o apóstolo: “Anunciar o Evangelho não é glória para mim; é uma obrigação que se me impõe. Ai de mim, se eu não anunciar o Evangelho! (I Cor 9, 16)”. Nenhuma realidade da Igreja foi suscitada para os cristãos se olharem no espelho, mas para participarem do zelo pelo Evangelho, olhando para frente e para o alto.

B) “Compromisso novo no seu entusiasmo, nos seus métodos, na sua expressão”. Se as Comunidades são “novas”, haverão de se exercitar a criatividade, deixando-se conduzir em sua oração e discernimento, para colocar à disposição da Igreja o que entenderam do novo de Deus para o nosso tempo. Não esperamos de vocês apenas uma repetição do que outras formas de dedicação a Deus oferecem. Tenham a coragem de ousar! Preocupa-me a tendência de imitação da Vida Religiosa e a clericalização ou, pior ainda, o clericalismo nos membros das Comunidades. A matriz das Comunidades é a Teologia do Laicato desenvolvida a partir do Concílio Vaticano II. Os membros das Comunidades que se sentirem chamados ao sacerdócio deverão buscar uma forma mais mariana de vivê-lo, sabendo reencontrar, a cada dia, a raiz comunitária de seu ministério, exercendo-o a partir do Carisma a que foram chamados.

C) “Os Movimentos eclesiais e comunidades representam um dos frutos mais significativos daquela primavera da Igreja anunciada pelo Concílio Vaticano II”. Se pelos frutos se conhece a árvore (Mt 7,20), já é possível verificar, pela história já significativa de muitas das novas realidades eclesiais, o que floresceu no campo da Igreja. Por outro lado, acrescento que um dos rebentos mais significativos é a alegria. Ouso dizer que as Novas Comunidades têm como tarefa a alegria que é um dos frutos da ação do Espírito. “O fruto do Espírito é caridade, alegria, paz, paciência, afabilidade, bondade, fidelidade, brandura, temperança. Contra estas coisas não há lei. Pois os que são de Jesus Cristo crucificaram a carne, com as paixões e concupiscências. Se vivemos pelo Espírito, andemos também de acordo com o Espírito” (Gl 5, 22-25). Comuniquem a todos a perene jovialidade da Igreja.

Ouça: Novas Comunidades: "Portadoras de novidade"

D) “A fé sem ‘se’ nem ‘mas’ ”. Não é difícil percebeu que muitas das dificuldades encontradas pelas Novas Comunidades vêm da falta de testemunho de seus responsáveis e de seus membros. Isso conduz a uma perigosa generalização, na qual se julga o conjunto daquela realidade de Igreja. Esperamos de todos, como de resto esperamos de todos os segmentos de Igreja, um esforço imenso de superação das eventuais dificuldades. Cuidem de tornar prioritária a estrada mestra da santidade, segundo a recomendação do número 31 da Novo Millenio Ineunte: “É hora de propor de novo a todos, com convicção, esta medida alta da vida cristã ordinária: toda a vida da comunidade eclesial e das famílias cristãs deve apontar nesta direção. Mas é claro também que os percursos da santidade são pessoais e exigem uma verdadeira e própria pedagogia da santidade, capaz de se adaptar ao ritmo dos indivíduos; deverá integrar as riquezas da proposta lançada a todos com as formas tradicionais de ajuda pessoal e de grupo e as formas mais recentes oferecidas pelas associações e movimentos reconhecidos pela Igreja”.

E) “O elemento carismático, que oferece novas iniciativas, novas inspirações, nova animação”. O que vocês têm de melhor é o próprio carisma! E Carisma não é dado para a vaidade própria. Carisma é dom que está em nós para os outros!

F) Vida Evangélica! Com muita freqüência, depois de reclamar das estruturas da Igreja, Comunidades se organizam com um organograma pesado de governo, no qual o peso excessivo das autoridades que se constituem faz com que a vitalidade perene do Espírito não se manifeste. É bom esperar um tempo razoável, antes de se fazer estatutos, regras de vida, constituições…

G) “Conservar a comunhão com o Papa e os Bispos”. Sejam fiéis à inspiração do Senhor, submetam-na ao Bispo, em sua Diocese de origem. Quando um Bispo acolhe uma realidade de Igreja, saibam que, malgrado nossos limites pessoais, ali está presente o exercício de um Carisma próprio do Episcopado, o discernimento.

H) Os bispos esperam das Novas Comunidades um caminho de amadurecimento, na superação de exclusivismos e no estabelecimento de um fecundo caminho de diálogo.

4. MENSAGEM A ESTA CONFERÊNCIA, ENVIADA PELO SECRETÁRIO DE ESTADO, CARDEAL TARCISIO BERTONE, EM NOME DO SANTO PADRE:

Ao concluir a mensagem, o Cardeal manifestou as prioridades elencadas no encontro dos Movimentos e Comunidades em Bogotá, no último mês de Março, que quero propor como perspectivas para as Novas Comunidades:

a) Formação cristã,
b) Uma poderosa proclamação diante do mundo,
c)  Um estilo missionário consistente,
d) Uma preocupação com os mais pobres, com os que sofrem e com os excluídos.

Ouça: "As Comunidades tem como tarefa a alegria"

5. CONCLUSÃO:

É ainda com as Palavras do Apóstolo São Paulo que quero concluir nossa conversação: I Tes 3, 1-13:

“Assim, não podendo mais esperar, resolvemos ficar sozinhos em Atenas, e enviar-vos Timóteo, nosso irmão e ministro de Deus no Evangelho de Cristo. Ele tem a missão de vos fortalecer e encorajar na vossa fé, a fim de que, em meio às presentes tribulações, ninguém se amedronte.

Vós mesmos sabeis que esta é a nossa sorte. Estando ainda convosco, vos predizíamos que haveríamos de padecer tribulações. É o que aconteceu e estais sabendo. É este o motivo por que, não podendo mais suportar a demora, mandei colher informações a respeito da vossa fé, pois receava que o tentador vos tivesse seduzido e resultasse em nada o nosso trabalho.
Mas, agora, Timóteo acaba de voltar da visita que vos fez, trazendo excelentes notícias da vossa fé e caridade.
Ele nos falou da afetuosa lembrança que de nós sempre guardais e do desejo que tendes de nos rever, desejo que é também nosso. Assim, irmãos, fomos consolados por vós, no meio de todas as nossas angústias e tribulações, em virtude da vossa fé. Agora, sim, tornamos a viver, porque permaneceis firmes no Senhor.

E como poderíamos agradecer a Deus por vós, por toda a alegria que tivemos diante dele por vossa causa?! Noite e dia, com intenso, extremo fervor, oramos para que nos seja dado ver novamente a vossa face e completar o que ainda falta à vossa fé.
Que Deus, nosso Pai, e nosso Senhor Jesus nos preparem o caminho até vós!

Que o Senhor vos faça crescer e avantajar na caridade mútua e para com todos os homens, como é o nosso amor para convosco.  
Que ele confirme os vossos corações numa santidade irrepreensível, diante de Deus, nosso Pai, por ocasião da vinda de nosso Senhor Jesus com todos os seus santos!”

 

Dom Alberto Taveira Corrêa,
Arcebispo Metropolitano de Palmas.


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