Nascemos para ser de Deus

Padre Demétrio
Foto: Wesley/CN

Durante o tempo de carnaval são muitos os que se esquecem de Deus e procuram diversão à margem do seu Criador.

A maior ofensa que Deus experimenta em Seu coração são as ofensas de Seus filhos. Queremos pedir perdão ao Senhor pelas nossas ofensas, que o Senhor venha purificar nossa lama de pecado. Senhor, se eu passei um dia sem o Senhor, ou uma hora, me perdoe, não quero mais fazer isso. Eu que quero convidar você a viver esse espírito de reparação.

“O desejo de Deus é um sentimento inscrito no coração do homem, porque o homem foi criado por Deus e para Deus. Deus não cessa de atrair o homem para Si e só em Deus é que o homem encontra a verdade e a felicidade que procura sem descanso”. (Frase de Santo Agostinho, extraída do Catecismo da Igreja Católica, n. 27-30).

Todo ser humano traz em si a vontade de encontrar-se com Deus. Porque aqui está a nossa origem: Fomos criados por Deus e para Deus. O homem não pode ser equiparado a outros animais. Somos um dom do amor para o amor.

Desde sempre os homens que tiveram o desejo de viver bem a sua vida fazem a sua história. Perguntando-se: “Quem sou eu?” Não somos frutos de um acaso. Deus sonhou conosco, fomos criados por Ele. Quando Deus nos cria já coloca em nosso coração o desejo por Ele. Mas nem sempre o homem sabe saciar esse desejo transcendente de Deus Pai. Ao longo da história da humanidade vemos os homens procurarem meios de encontrar o Senhor, por isso existe a criação de várias religiões.

No Catecismo da Igreja Católica, parágrafo 28,  afirma: “De muitos modos, na sua história e até hoje, os homens exprimiram a sua busca de Deus em crenças e comportamentos religiosos (orações, sacrifícios, cultos, meditações, etc.). Apesar das ambiguidades de que podem enfermar, estas formas de expressão são tão universais que bem podemos chamar ao homem um ser religioso.”

A religião não é fruto de algo cultural, o ser religioso é parte intrínseca do homem. Mas e o ateísmo de onde vem? O homem não nasce ateu. O ateísmo é sempre uma resposta revoltosa do ser humano ao seu Criador. Nós nascemos com o desejo inscrito de Deus em nosso coração.

Quais são as razão pelas quais o homem quer sufocar esse desejo de Deus em seu coração? O Catecismo da Igreja Católica enumera-as:

 – A revolta contra o mal existente no mundo. Se Deus é bom, se Ele é a bondade em essência por que tanto mal no mundo? Quantas pessoas se revoltaram contra Deus e quiseram viver como se Ele não existisse? Deus pode se servir de um mal para tirar um bem maior, por isso permite muitas coisas. A Providência de Deus se serve de um mal para nos aproximar de d'Ele.

Ignorância e indiferença religiosa são o segundo motivo. São muitos os jovens que não conhecem a Jesus Cristo. Não só os jovens que estão fora dos muros eclesiásticos, mas os de dentro também. Se fizéssemos uma enquete depois da Santa Missa perguntando quem sabe quem é Jesus Cristo, poucos responderiam que é o Filho de Deus encarnado.

"Somos um dom do amor para o amor", assegura padre Demétrio
Foto: Wesley/CN  

   
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– Terceiro ponto é o mau exemplo dos crentes. Aqui podemos colocar a mão na consciência e perguntar-nos quantos exemplos maus, quantas pessoas não comungam mais, não estão mais na Igreja pelo seu mau exemplo. Somos responsáveis pela salvação, mas também pela condenação de muitos. Ninguém se salva e ninguém se condena sozinho! A sua família, os seus amigos dependem da sua fidelidade.

Quando a tentação vier sobre você, pense em quantas pessoas dependem do "sim" que você deu a Deus. Se você for fiel, levará muitas pessoas ao céu, mas se der mau exemplo muitas pessoas serão condenadas.

– Quarto motivo: corrente de pensamentos hostis à religião. É um ateísmo refinado, de pessoas que dizem fazer uso da razão. Nós não precisamos deixar de pensar para crer, o Deus que lhe deu a fé deu também o pensamento. Nossa fé não é irracional, há uma coerência profunda entre a nossa fé e a nossa razão. O Papa João Paulo II diz que a fé e a razão são duas asas que nos elevam aos céus.

Quinto ponto: atitude do homem pecador que, por medo, se esconde de Deus e desaparece quando Ele chama. Essa figura aparece no primeiro livro da Bíblia quando Adão peca e se esconde de seu Criador. Existem, hoje, homens que se escondem de Deus no pecado e dizem que Ele não existe. Essas pessoas preferem ficar no pecado e dizer que Deus não existe, logo tudo está permitido. Aqui entendemos por que tanto ódio pela Igreja.

Você conhece algum católico que já agrediu alguém verbal e fisicamente porque este não era católico? Não! A nossa resposta é sempre pagar o mal com abundância de bens. Por que tanto ódio, tanto rancor contra os cristãos? É porque cada cristão que vive de forma coerente a sua fé é uma luz que aponta para a consciência do pecador lhe dizendo: "Veja que o que você está fazendo não é bom!" Essas são as razões pelas quais o Catecismo da Igreja Católica aponta por que o homem não quer a Deus.

“A minha alma tem sede de Deus, de vê-Lo face a face”. O homem traz em si esse desejo de Deus. Santo Agostinho conseguiu retratar bem e de forma poética esse desejo de Deus neste texto: “Tarde Vos amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei! Eis que habitáveis dentro de mim, e eu, lá fora, a procurar-Vos! Disforme, lançava-me sobre estas formosuras que criastes. Estáveis comigo e eu não estava Convosco […]”. 

Depois de tanto procurar, Santo Agostinho pôde encontrar-se com a beleza que estava dentro e não fora dele. Até quando vamos procurar fora de nós aquilo que só Deus pode nos dar? Só Deus nos sacia. A razão maior das nossas decepções deste mundo é porque queremos encontrar nas pessoas aquilo que só Deus pode nos dar. Nem o melhor homem ou a melhor mulher do mundo não serão capazes de nos saciar! Aquilo que é finito não pode saciar o desejo do nosso coração. Nascemos para Deus e inquieto está o coração, pois só encontra repouso em Deus.

Os homens e mulheres de Deus podem cair na tentação de colocar as coisas d'Ele no lugar d'Ele. É um risco que está em torno das pessoas boas, que acabam trocando Deus pelas coisas de Deus. Ele deve ter sempre a primazia do nosso amor. Nada mais me importa, arranque-me tudo e deixe-me Deus.

"A nossa resposta é sempre pagar o mal com abundância", afirma padre Demétrio

Foto: Wesley/CN

 
O Papa emérito Bento XVI, quando se reuniu em Assis com os jovens, disse: “O finito pode dar-nos centelhas de alegria, mas só o infinito pode saciar nosso coração”. Fomos criados por Deus e para Deus, para sua vida divina e é isso que pode nos dar a santidade.

No dia do meu batismo minha alma se rasgou e o céu a encheu, e essa vida é chamada a ser desenvolvida. A santidade, assim como uma fogueira, se você não coloca lenha nova o fogo se apaga. A santidade não se dá automaticamente, pois trazemos em nosso "barro" as consequências do pecado original. Se não lutamos dia após dia permitimos que essa vida no Espírito vá esfriando até desaparecer por completo. Na vida espiritual ou caminhamos para frente ou regredimos, ninguém fica parado. É como diz a Palavra de Deus: “O cão volta a lamber o próprio vômito.”

Devemos ter uma clara consciência de que devemos lutar para ser de Deus, pois Ele nos deu a liberdade. A santidade é um dever que todos recebemos do nosso Criador. Madre Teresa de Calcutá, certa vez, disse: “A santidade para mim não é um luxo, mas uma necessidade”.

Hoje vemos na sociedade uma "bestialização" do homem, que acaba se assemelhando a um animal que age inconsequentemente. O homem está em reducionismo antropológico, que o faz ser considerado com qualquer outra criatura. O homem pensa que não existe um céu, não existe inferno, não existe um Deus que retribua a nossa santidade. Logo pensa-se: “Comamos e bebamos, aproveitemos enquanto vivemos, porque depois que morrermos estará tudo acabado!” Quer você creia, quer não, você tem uma alma imortal, que vai se encontrar com o seu Criador depois de sua morte.

Devemos cuidar para não cair no pelagianismo, corrente herética que prega que o homem se salva por seu esforço; isso é herético, pois, sem a graça de Deus, o homem não se salva. Há outra heresia do quietismo em que o homem é automaticamente salvo, não existe salvação sem esforço humano. É a graça de Deus que me salva, mas com a minha colaboração. “O Deus que te criou sem ti, não te salvará sem ti.” É necessário lutar pela salvação. Lutar contra o demônio, o mundo e a carne.

O demônio é criatura de Deus, que não pode nada contra nós se não nos aproximarmos dele. O mundo que aparece na Sagrada Escritura é visto de duas formas: como algo bom, “Deus criou o mundo e viu que era bom”; porém, há outro mundo classificado por São João: “O mundo desfigurado do pecado quer nos afastar de Deus.” Esses não são os nossos maiores inimigos. Nosso maior inimigo somos nós mesmos, a carne. Existe este conflito dentro de nós mesmos, enquanto minha alma deseja o céu, há também o "homem velho", que me empurra para baixo. E porque estamos em constante combate nunca poderemos descansar, dizer: "Basta! Já sou santo". A Igreja quer nos ensinar que a nossa vida é um verdadeiro combate, querer ser de Deus não é só sentimento. A sua fidelidade a Deus não se mede pelas lágrimas, mas sim pelos sacrifícios, pela fidelidade de cada gesto que Deus lhe pede.

Boas intenções e bons motivos não nos levam ao céu; o que nos leva ao céu é o  nosso "sim" de cada dia. É ter um plano de oração diária, relacionamento com Deus, os sacrifícios, as penitências. Hoje é quase proibido falar de penitência, mas se não soubermos dizer "não" às coisas lícitas, não saberemos dizer "não" às coisas ilícitas.

A irmã de São Tomás de Aquino, certa vez, perguntou a ele o que era necessário para ser santa. Ele respondeu-lhe: "Querer!" Queiramos a santidade que vem de Deus! 

Transcrição e adaptação: Rogéria Nair

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