Livres das fantasias que escondem nossas verdades

Padre Fabricio

Padre Fabrício Andrade. Foto: Wesley Almeida/cancaonova.com

Nesta sexta semana do tempo comum, a oração é assim: “Ó Deus, que prometestes permanecer nos corações sinceros e retos, dai-nos, por vossa graça, viver de tal modo, que possais habitar em nós”. Esta é a luz para entendermos e experimentarmos a liturgia. Deus, quando o olha, vê o seu coração e não o valor da oferta que você faz.

A primeira leitura de hoje fala de dois irmãos, Caim e Abel. Caim era o mais velho, agricultor e imolava um sacrifício ao Senhor com os frutos do campo. Abel era pastor de ovelha e também oferecia sacrifícios ao Senhor e cada um oferecia a Ele o que tinha. O Senhor não gostava mais das ovelhas do que dos produtos do campo.

É um mistério da liberdade de Deus não ter olhado para a oferta de Caim. O Senhor se agradou da oferta de Abel num segundo momento. O que chama a atenção de Deus é o coração de quem faz a oferta. O Senhor olhou para Abel, viu que ele se aproximou para fazer a sua oferta com o coração reto e sincero e não se utilizou de nenhuma máscara.

O coração de Caim estava mascarado, não estava reto, sincero. Pela reação de Caim sabemos o que se passava em seu coração. Deus se agradou da oferta de Abel por causa do seu coração.

Deus não se encanta com a marca do meu sapato, nem com a beleza da minha roupa. Caim achou que agradaria a Deus com a máscara de piedoso, ficou com raiva do dom do irmão e não soube se alegrar com ele. Caim fez do seu sacrifício um desfile de escola de samba, uma fantasia. Deve ter sido uma cesta bonita, com os melhores produtos do campo, mas Deus não se deixa comprar pela aparência.

Caim deixou que a fantasia tomasse conta da verdade. Seu coração ficou cheio de cólera e o rosto abatido. A fantasia esconde uma verdade e não estou criticando a manifestação cultural [do carnaval, etc.], estou me referindo a músicos que podem se esconder atrás de sua música e a peregrinos que podem se esconder atrás de camisetas.

Quem não tem coragem de encarar sua verdade sempre vai fazer propaganda de uma fantasia. Uma mãe que não encara sua verdade vai vender uma fantasia de mãe perfeita. Fantasia chama a atenção dos olhos, mas não preenche o coração. Caim pensou que poderia comprar Deus e, muitas vezes, nós achamos que podemos comprá-Lo também.

Aqui falo de um carnaval que dura mais de quatro dias, um carnaval em que não vivo a minha história e invento uma fantasia. No entanto, fantasia tem prazo de validade curto.

Como seria bom se o Brasil fosse conhecido não como o país do carnaval, mas como o país de pessoas verdadeiras! Que bonito se o símbolo do Brasil não fosse de uma pessoa fantasiada, mas de uma pessoa com rugas, de uma beleza natural.

Adão e Eva romperam a harmonia que existia no éden, queriam ser Deus e se fantasiaram de Deus. Caim retirou a harmonia que existia com o irmão. Quem vive de fantasia não suporta a verdade.

Peregrinos

“Deus quer amar você com sua verdade”, diz padre Fabrício. Foto: Wesley Almeida/cancaonova.com

Nós somos de verdade e precisamos rasgar as fantasias que fomos utilizando para comprar o apreço dos outros e até mesmo de Deus.

Deus respirou fundo e solicitou que Caim rasgasse a fantasia e Lhe desse a verdade, pois conhecia a verdade dele. Deus não queria assaltar a liberdade de Caim, pedindo que ele mesmo rasgasse a sua fantasia. Uma pessoa com o coração cheio de mágoa, fantasiada, não consegue ouvir a voz de Deus. Caim estava com o coração cheio de rancor e de ódio do irmão, por isso não escutou o Senhor.

Uma das fantasias mais vendidas hoje é a do “eu sou seu irmãozinho”. Cuidado com a falsa fantasia de irmão! Caim eliminou o próprio irmão fantasiado de “irmãozinho”. Quem não tem coragem de encarar sua verdade mata o outro, mata o que é verdadeiro porque ele incomoda.

Deus procurou Caim e lhe perguntou: “Onde está seu irmão”? O Senhor chegou perto dele e lhe fez essa pergunta, Ele não fez acusações, mas pediu que contasse a verdade. E Caim respondeu: “não sei”. Quem vive fantasiado não se preocupa com os outros, porque precisa sustentar a sua fantasia.

É preciso que você imole sua fantasia, que você mate sua fantasia, pois quem não mata sua fantasia acaba matando os outros. Quem não mata a fantasia do adultério acaba matando a esposa e os filhos.

Deus amou tanto Caim que respirou várias vezes para não desistir dele, mas ele não reagiu. O Pai quer fazer isso com você, quer amá-lo com sua verdade. Ele não vai obrigá-lo, mas Ele quer amá-lo de uma maneira tão profunda que o vai fazer querer rasgar a sua fantasia.

Caim se inflamou de cólera porque achou que Deus amou mais a Abel, mas, na verdade, ele [Caim] acabou sendo mais amado, contudo, ele tinha mágoa e criou uma fantasia para esconder isso.

Pode ser que, neste carnaval, você tenha criado uma fantasia para viver, porque você não foi olhado nem amado com respeito, mas depois de ouvir a história de Caim posso lhe falar que o Pai do céu sempre o amou. Deus não morreu numa cruz por causa da sua fantasia, mas por causa da sua verdade.

Transcrição e adaptação: Míriam Santos Bernardes

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