Dom José Falcão

Vigilância e preparação no tempo do advento

O Início do ano litúrgico, tempo do advento

O primeiro domingo do Advento marca o começo de um novo ano litúrgico, estabelecendo um período de preparação focado na dupla chegada do Senhor. Este é um tempo de tensão sagrada: Aquele que já veio virá. O Advento é um tempo de preparação tanto para as solenidades do Natal, que comemoram a primeira vinda do Filho de Deus entre os homens, quanto para a expectativa de Sua segunda vinda no fim dos tempos, quando há de vir para julgar os vivos e os mortos, conforme a profissão de fé.

Aquele que já veio no tempo e virá para arrematá-lo é também Aquele que continuamente quer vir, está vindo, inclusive neste exato momento, como está escrito em Apocalipse 3,20: “eis que estou à porta e bato, se alguém abrir, entrarei e cearemos juntos, eu com ele e ele comigo”.

As três vindas de Jesus, segundo São Bernardo de Claraval

Para ilustrar essa realidade, São Bernardo de Claraval, doutor da Igreja do século XII, ensina sobre uma tríplice vinda do Senhor:

  1. A Primeira vinda: O Senhor apareceu na terra e conviveu com os homens. Ele veio na fraqueza da carne, sendo nossa redenção,.
  2. A Última Vinda: Todo homem verá a salvação de Deus e “olharão para aquele que transpassaram”. Nesta vinda, Ele virá em todo o esplendor de Sua glória e aparecerá como nossa vida.
  3. A Vinda Intermediária: Esta vinda é espiritual e nela somente os eleitos O veem em si mesmos e recebem a salvação. Ele vem espiritualmente, manifestando o poder de Sua graça, e é nosso consolo e consolação. Esta vinda intermediária é como um caminho que conduz da primeira à última.

A dupla dimensão de Cristo em São Cirilo de Jerusalém

São Cirilo de Jerusalém, bispo e doutor da Igreja no século IV, reforça a ideia da dupla dimensão de tudo o que concerne a Jesus Cristo. Ele afirma que anunciamos não apenas a primeira vinda, mas também a segunda, que será “muito mais gloriosa”. A primeira revestiu um aspecto de sofrimento, mas a segunda manifestará a coroa da realeza divina.

Não devemos nos deter somente na primeira vinda, mas esperar ansiosamente a segunda.

A profecia de Isaías: da crise de Judá à Paz Messiânica

A primeira leitura, extraída do profeta Isaías, que viveu durante um período de grande tensão militar com a Assíria e a Babilônia, bem como crises diplomáticas, sincretismo religioso e prosperidade econômica desigual em Judá, anuncia uma realidade futura: a supremacia do Deus de Israel sobre todas as nações.

O profeta visualiza que “o monte do templo do Senhor será estabelecido no cume dos montes”, e todas as nações afluirão para lá voluntariamente para aprender os caminhos do Senhor.

O Chamado de São Paulo: despertar e o desprendimento Relativo

Diante do anúncio da segunda vinda e do juízo, a Igreja, através de São Paulo (Romanos 13,11-14), nos convida a uma postura de vigilância.

O primeiro versículo da segunda leitura afirma: “já é hora de despertar”. Segundo São João Crisóstomo, isso não se refere ao sentido físico, mas ao fato de que o dia da ressurreição e do julgamento aproxima-se rapidamente, e se não estivermos preparados, devemos ter cuidado, mas o objetivo é nos encorajar e desprender do amor pelas coisas deste mundo.

São Paulo aconselha que a “figura desse mundo passa” e que, portanto, aqueles que têm esposa, vivam “como se não as tivessem”; e os que choram, “como se não chorassem”.

O Significado do Desprendimento “Como se”:

O apóstolo usa o termo “como se” para indicar um relativo desprendimento. Devemos amar as pessoas que Deus coloca em nossa vida, esposos, filhos, amigos, reconhecendo a bondade de Deus. Contudo, essas realidades não podem ser o sentido ou a razão de nossa vida.

O sentido da vida não pode ser a criatura, pois se elas integram nossa felicidade, ou seremos tirados delas, ou elas serão tiradas de nós. A criatura não merece o qualificativo de “razão da minha vida”. Segundo o apóstolo, “para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro” (Filipenses 1,21).

A Conduta Moral e o Revestimento de Cristo:

São Paulo adverte que a “noite já vai adiantada, o dia vem chegando” e devemos nos despojar das ações das trevas e vestir as armas da luz, procedendo honestamente.

  • Noite refere-se ao tempo da ignorância; Dia, ao tempo depois da vinda do Senhor.
  • Devemos evitar glutonerias, bebedeiras, orgias sexuais, imoralidades, brigas e rivalidades. São João Crisóstomo esclarece que a proibição não é contra o álcool ou a relação sexual, mas contra o uso excessivo e a fornicação, buscando eliminar as paixões mortais da luxúria e da ira.

É essencial buscar o justo descanso e a diversão, lembrando-se da frase “Tudo me é permitido, mas nem tudo convém; tudo me é permitido, mas não me deixarei escravizar por coisa alguma”,.

O Evangelho: vigilância como nos tempos de Noé

A liturgia do Advento nos remete à segunda vinda do Senhor. Jesus, no Evangelho (Mateus 24,37-44), faz alusão ao evento catastrófico do dilúvio na época de Noé.

Nos dias antes do dilúvio, os homens “comiam e bebiam, casavam-se e davam-se em casamento”, mas não perceberam nada até que o dilúvio veio e os levou a todos. O problema da humanidade naquela época era a insensibilidade ao chamado de Deus e a prática do pecado, vivendo numa falsa sensação de segurança.

A destruição repentina

Ninguém pode ter a ingenuidade de achar que acordará amanhã ou transporá o ano novo, pois “para morrer basta estar vivo”. São Paulo diz aos Tessalonicenses: “Quando os ímpios disserem paz e segurança, então lhes sobrevirá uma destruição repentina”. A mensagem, portanto, não deve causar medo, mas sim uma serenidade traduzida na convicção: estar preparado, para o encontro com o Senhor e a prestação de contas

O juízo imediato

Jesus afirma que “dois homens estarão trabalhando no campo, um será levado e o outro será deixado; duas mulheres estarão moendo no moinho, uma será levada e a outra será deixada”,.

  • Santo Ambrósio explica que o homem tomado é o bom semeador, que semeou em solo cultivado, esmagado pela humildade. O deixado é o semeador do joio,.
  • Santo Agostinho esclarece que a mulher tomada é aquela que pratica boas obras, atende aos pobres, é fiel no louvor e não cobiça, enquanto a outra, que é má cristã, será deixada,.

Vigiar e estar preparado

Jesus adverte: “Portanto, ficai atentos porque não sabeis em que dia virá o Senhor”,.

São Gregório Magno, Papa e Doutor da Igreja, define que vigia aquele que:

  1. Tem os olhos abertos em presença da verdadeira luz.
  2. Observa em suas obras aquilo em que crê.
  3. Afugenta de si as trevas da indolência e da negligência.

Jesus compara Sua vinda à de um ladrão que arrombaria a casa se o pai de família não estivesse vigilante,.

  • São Gregório Magno explica que o ladrão é a morte repentina que “mina a casa” sem que o pai de família saiba. A morte penetra violentamente na morada da carne e mata o senhor da casa que estava dormindo. O Senhor quis que a última hora ficasse desconhecida para que nos preparemos “sem interrupção”.
  • Santo Hilário de Poitiers afirma que o ladrão é o diabo, que vigia para se apoderar do que é nosso, arremetendo contra o corpo com “os raios de seus desejos de luxúria”. A vigilância, portanto, é manter-se em contínua oração e cumprimento absoluto dos mandamentos.

O juízo de misericórdia 

Deus nos deu a possibilidade de começar este novo ano litúrgico com a certeza: “tu vieste ó Salvador e tu virás”. Vieste humilde, virás glorioso; vieste para advogar nossa causa, mas virás para nos julgar,.

O juízo será terrível para quem se encontrar em inimizade com o Senhor, mas será um juízo de misericórdia para quem praticou a misericórdia. A certeza da segunda vinda, como juiz poderoso e imparcial, deve fazer nosso coração se amedrontar.

Jesus adverte: “Não temais aquele que tem o poder de tirar a vida do corpo, mas não podem tirar a vida da alma; temei aquele que tem o poder de precipitar o corpo e a alma no fogo da geena”,.

Que o tempo do Advento nos motive a buscar o Senhor enquanto Ele se deixa achar, e que a alegria do presépio nos encoraje, mas que o temor de nos encontrarmos despreparados em Sua segunda vinda nos mantenha vigilantes.

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